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segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Não se sabe do verso o que peço
nem do que se ama o que é.
Se o sentimento extinto se faz regresso
ou se todo samba acaba no pé.

Não se sabe das coisas o início,
'inda muito menos se sabe seu fim.
Se o começo de tudo é só um resquício
d'outro princípio que terminou assim.

Não se sabe das mulheres todo o encanto,
nem todo pranto de quando a noite cai.
Se seu melindre é verdade de santo
ou se sobre a cama todo ele se esvai.

Não se sabe do amor a existência
nem das suas formas a que é mais reta.
Mas se sente no peito a consequência
do torpe amar que inócuo desperta.

Não se sabe de todo poeta a loucura
nem se a poesia, por si, já não é direita.
Mas é de se notar as falhas da moldura
que distingue o quadro são da parede imperfeita.

Não se sabe do rio a verdade das dóceis águas
que desembocam misteriosas no tempestuoso mar.
Apenas que, doce ou salgada, é histérica a mágoa
que pulmões cheios d'água podem aos olhos causar.

Não se sabe destes versos a veracidade
nem mesmo se, de fato, a verdade existe.
Se estas mentiras corrompem seus olhos pela claridade
ou se são as trevas que culminam nesse ponto triste.


Amor Livre,
Recife, 6 de Dezembro de 2010, 23:10h.

sábado, 27 de novembro de 2010

Meu coração sangrando todo o meu corpo
e no peito o gosto amargo do desgosto.
Da esperança que sai de mim e acaba nos outros
tantos rostos que assolam desejos tão pueris.

À toa, não sabem de minhas necessidades.
Que preciso dos ares arredios femininos
e seus mais barulhentos sussurros e silêncios
que, de tão lascivos e castos, são plurais.

Que preciso da bebida dos bares e dos ébrios
pensamentos solitários que me socorrem do nada.
Socorrem-me da falta de estímulos sonoros
e da falta das outras coisas de que careço.

Do silêncio, do abraço, do beijo.
Do silêncio do abraço do beijo
quando tudo de mais lindo que há
está escondido por entre estas palavras.

Brincando comigo do jogo da vida e da morte
feito uma criança traquina a brincar com revólver.
Mas não dispara, acertando-lhe o frágil crânio.
Não nos priva de tanta e toda a sua beleza.

Feito esta criança levada que rodopia
nas deformidades da margem direita
deste texto que a cria do nada,
deste desejo que a minha alma deseja.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Benditos sejam aqueles
que delegam aos céus
os seus mais torpes atos.

Glorificado seja o nome
de quem mente tão bem
que descrê da própria verdade.

Santificadas sejam as mulheres
da vida das avenidas e das esquinas
pois têm em seu galardão
a hoste das impurezas terrenas.

Livrado seja o altíssimo
de atender a todas as súplicas
e renegar a nós os vícios
de nossas mais puras iniquidades.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Se eu pudesse apenas um pedacinho da pele dessa mulher
mesmo que fosse pela brecha
do meu mais volúvel pensamento.

Se eu pudesse uma porçãozinha das douradas madeixas
que desfilam pelo invisível vento
sem nem tocar as minhas queixas.

Se eu pudesse seus olhos, seus lábios e sua voz macia.
Ou mesmo o seu cruzar de pernas
que meu olhar tanto acaricia.

Se eu pudesse tê-la e amá-la, fazê-la possuída e amada
nunca seria escrita esta dura palavra:
quimera! - que na língua do meu desejo amarga.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

O mundo não liga para as suas dores.
Supere-as e vença.
Ou sofra-as todas e seja derrotado.
Derrotado pelo mundo.

Por este mesmo mundo que te cerca
com tantos sorrisos e boas educações.
Por este mesmo mundo que te come
e joga os ossos aos ladrões.

Aos ladrões famintos que têm fome de tudo
que habitam seu terreno, habitam seu terreiro,
habitam seu interior e habitam todo o resto
deste mundo desmundo.

Não é preciso sorrir, nem sentir alegria
- saiba, seu jovem e cretino inumano.
É preciso ser pisoteado pelos sete céus,
sacaneado por deus e pelo diabo.

Imprescinde se sentir sujo e mal cheiroso,
coberto de tudo que há de mais podre até o pescoço,
mendigando esta mesma esmola arredia
pela qual nos maltratamos e nos desamamos, dia a dia.

Indispensável é fingir que gosta de ser esmurrado
ter os dentes todos da boca arrancados
e o nariz partido em dois, quebrado.
Só assim para se sentir deste mundo.

Deste mundo que te quer como um ladrão,
roendo as migalhas que o deus rico joga ao chão
que são os restos de quem não se rendeu
às duras penas da lei terráquea.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

- Boa tarde.
- Já é tarde?
Pensei que fosse mais cedo.

Cedo ao ponto de ficares mais um pouco
e tomares um café comigo
enquanto discutimos as coisas boas da vida.

Até que, de fato, seja tarde.
Tarde demais para ires embora
e me largar junto a meus devaneios solitários.

Tarde ao ponto de perdermos nossas boas maneiras
e nos despirmos deseducadamente
como se nunca fosse cedo ou tarde para isso.

sábado, 16 de outubro de 2010

Quero alguém para foder.
Só foder.
Não quero que me sinta
o homem mais perfeito da terra.

Nem que se sinta a mais desejada,
macia, gostosa e perfumada mulher.
Mas sinta prazer.
Apenas que sinta.

É pedir demais?
Deus é perfeito.
Fez-nos suficientes
paus e bocetas.

Ajamos, então, como Ele quer
e como o Diabo gosta.
Assim, feito homem e mulher.
Como Adão fodendo Eva de costas.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010


Virgínia lançou-se a mim, quart'adentro,
com seus trinta e dois quilos de pura
elegância, minissaias e pequenas blusas
escolhidas em desacordo com o soutien
- nunca presente.

Eu, em mais um dos meus etéreos momentos
de ódio e ode ao mundo,
não prestei muita atenção aos seus cabelos,
mais sujos que de costume,
e às cicatrizes mais recentes,
que se vinham acumulando ao longo do pulso.

Não era uma garota triste,
eu bem sabia.
Só não gostava muito da vida
ou achava isso.
Perdia-se todo, seu senso de existência própria,
quando não se dava aos bares, às esquinas.

Virgínia, que conheci ainda menina,
agora era rejeitada pelo mais ignominioso
bêbedo de toda a cidade.
Não eu.
Vinha a mim sempre em busca de cama,
comida ou drogas.
Nunca por sexo, banho, diálogos
ou outras delicadezas tais.

É. Não era por completo imperfeita.
Aprendera com a vida bandida
que coxas, vaginas e peitos falam mais
que garganta, língua e lábios.
E que esses últimos podem ser usados
para ofícios mais proveitosos.

Desta vez não me trazia a agitação
dos lugares, dos sons, dos pênis
pelos quais passava.
Às vezes era mesmo contagiante
vê-la adentrar meu humilde recinto
portando aquele sorriso imodesto
de quem é pura e simplesmente felicidade
- que muitas pessoas sustentam
na cara.

Havia consigo apenas a resignação
à inevitável depressão
que se sente após dias ou semanas
de abuso dos prazeres mundanos.
Que é como se a vida toda se tivesse ido
ao curto desses longos dias e noites
e não restasse mais o que fazer,
a não ser espreitar a morte
- tarefa de todos nós.

A Virgínia, talvez, nem mesmo isto
restasse.
Não disse que meus textos a apraziam,
enquanto fingia que os lia atentamente.
Não mentiu que me devorava em pensamentos
e que queria executar comigo proezas sexuais
as quais com nenhum outro homem realizara.

Apenas se calou.
Apenas se despiu.
Apenas se deitou.

Antes que adormecesse,
apanhei suas roupas,
vesti seu corpo mole,
matei suas esperanças
e extirpei suas cicatrizes
para fora do meu apartamento.

Virgínia, que não era minha
nem nada,
agora sofria suas angústias de ressaca
em outro lugar.
Até que encontrasse outra garrafa,
outro pênis que não a tivesse furado,
outra razão que expusesse seu valor vital
- nenhum.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Lá vinha aquele par de olhos,
como os olhos do carrasco
que me vinha arrancar a cabeça
de cima.

Não sem suas protuberâncias
descomunais, que se amontoavam
no tórax, em forma disto
que alguns chamam peitos.

E como eram lindos.
Grandes, roliços, firmes e macios.
Suas pupilas, como aréolas vibrantes,
envoltas do verde obscuro de suas íris.

- Não sou daqui - repeli aquela visão
ardente do paraíso.
Sou de onde a serventia do corpo
é só o pecado.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Anáfora

Anáfora.
Ana fora.
Amar fora.
Amar afora.
Amar a forca.
Amor dá força.
Anal à força.
Anal afora.
Anafo rá!
Anáfora.
Ana, a!
Ana.
An?

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

A minha barriga fala comigo.
Mas eu não escuto, não:
eu sou a fome do mundo,
eu sou o miolo do pão.

As pessoas me olham torto,
mas isto eu compreendo bem:
sou eu, mais bêbedo que tolo,
sou eu quem mais erros tem.

O inferno me rejeita impiedoso
- cá no meu canto, eu sossegado:
já fiz de deus um ser glorioso,
depois o fatiei em mil e um pedaços.

Os narizes ressentem o meu cheiro,
das bocas não satisfaço o paladar:
sou o mais suado dos sertanejos
e o mais salgado dos homens a beijar.


Eu sou dou mau

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

O coração ainda pulsa, forte,
sobre a mesa cansada.
Cansada da mesmice dos dias
sob um coração tão abatido.

As pernas ainda correm
sobre o chão pisado e humilhado,
sob os céus quase descrentes
de tanta persistência e ligeireza.

É que o futuro fura o meu peito
- presente. E passa para um
passado indolente, achando
mentira tudo que é lembrança.

E o tempo 'inda reclama
de passar tão lentamente
por entre estes versos
mal acabados de amor
[e de ódio.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Isso 'tá parecendo chá
mas é café.
Isso 'tá parecendo homem
mas é mulher.

Isso 'tá parecendo velho
mas é criança.
Isso 'tá parecendo magro
mas é só pança.

Isso 'tá parecendo vivo
só que tá morto.
Isso 'tá parecendo cansaço
mas é desgosto.

Isso 'tá parecendo alegre
mas é que nada!
Isso 'tá parecendo sóbrio
mas é cachaça.

Isso 'tá parecendo rima
mas é engano.
Isso 'tá parecendo texto
mas desumano.

Isso 'tá parecendo sério
mas é piada.
Isso 'tá parecendo grito
mas tá calada.

Isso 'tá parecendo bomba
só que é tiro.
Isso 'tá parecendo suave
mas é castigo.

Autodicotomia

domingo, 12 de setembro de 2010

A verdade em cabelos, barba e pêlos.
Além daquela escondida na massa cinzenta
sob o crânio nefasto que abriga o infatigável.

domingo, 22 de agosto de 2010

Miserável andarilho
- anda sem rumo na vida,
não carece de espartilho
para tornar real a ferida.

Procura em tudo e em todos
a sobrevivência que lhe é usurpada.
Encontra no fundo do poço
a mais pura amostra de água.

Esconde-se sob os ladrilhos do mundo
e necessita da piedade do céu
para que um deslize, n'um segundo,
torne-lhe de vagabundo a condenado réu.

Mas vive uma vida sadia
- sendo que é tão real com o patrão
quanto com a mais puta vadia,
a dividir, sem remorsos, o pão.

Pior que qualquer um destes é
aquele que vê tão indelicada sina
e, como quem só à própria vida quer,
sem pesar ou pensar - apenas vira à esquina.


Da Impiedade Humana

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Ao me ver perseguir-te,
E o fazer com tremores,
Escalda-me a face ao fel
Constrangida de tantos rumores.

De tanto fugires procedes
A um deus desgabador
Que a tua pele fere,
Dando-te curso superior.

E o fazes com tal destreza
Que a minha ninfa princesa
Torna-se monstro usurpador.

Usurpa em ti a beleza d'outrora,
Convertendo-te a uma cotada senhora
Infiel ao nosso curso fundamental
[inferior.


antiquu usurpare
17/11/2007

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Que dirá de mim artista?
Sentado à beira da pista
de carona, pedindo ao desconhecido
para que em meu peito faça seu abrigo.

Que dirá de mim atleta?
Correndo feito pateta
de corpo são e mente mais sã ainda
sem saber onde essa estrada termina.

Que dirá de mim doutor?
Prescrevendo dos outros quem sou,
frequentando asilos d'outros amigos,
diagnosticando a cova que será meu jazigo.

Que dirá de mim poeta?
Escrevendo a dor que se sente
em um coração, relicário demente,
a sina de ser indelicada seta.


Do vazio d'agora

sábado, 5 de junho de 2010

Aqui, o vazio é um presente nosso.
Joguemos pedras nos corpos vãos
que odiamos - amaríamos (se)
anfetaminadamente simbólicos,
sambando na praça pública
e transando a tristeza só.

Ainda contando os segundos de me ver nu.
De me ter no segundo confronto -
De fronte, meu mar de suicídios egóicos:
que prazer, doutor!, dê-me a pílula de um além.

Em mim, está o inferno da cor.
Eu amo qualquer safado filho da puta.
Sou filho disto que te devora,
e meus irmãos de deus custam
a me amar.

Eu é que sou filho da puta. Marginal.
Enquanto houver entretantos,
e as terapias ilegais, sorrisos afeminados,
a maquiagem explícita, a vontade
de gozar numa boca com a boca roxa.

Quero é ouvir gemer. Tremer num ouvido
alheio, sem saber qual a nota frota de mim,
comer pernas quaisquer a ferro e aço,
e baseado no que fumo, fumar todo nu
lá ao meio de teu mar de coxas frouxas.

Doravante, contemporâneos, somos um só.
Somos todos ódio. E conjunto de pernas,
paus, mãos, bocetas, pêlos desgastados;
estuprando o amor, com roupas peles de meninos
que nas esquinas vendem a nossa dor.


T.
05 de junho de 2010.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Quando venho de longe
para mais perto do distante
minha mente suspira
em espasmos de cruéis indelicadezas.

É que o passado a habita
e tal é um habitante assaz:
furta ao inquilino todas as horas
- furta todo o sono do dono.

Quando passo por todas estradas
que já passei, olhei ou cheirei,
sinto meus nervos distantes,
viajantes de outras dimensões.

É que todos os lugares os habitam:
os pássaros de Correntina,
os amores de Juazeiro,
as cachaças de Petrolina.

E logo quanto tudo em minha volta
parece tão distante, alheio e confuso,
é que vejo, num toque frebril de retina,
toda a simplicidade desse mundo.

É que nada o meu coração habita
- e ele vive se perdendo no cada e em tudo.
É que lugar nenhum é o lugar
que a minha mente habita.

domingo, 9 de maio de 2010

Asmáticos pensamentos que habitam meu consciente,
libertem-se da jórnea que os torna tão inquietos
e ganhem o mundo,
as mundanas
e toda a cafeína.

Ganhem todo e qualquer resquício de sobriedade
para depois atirá-los fora como alguém que se desfaz
do lixo cotidiano,
dos vãos amores,
das inclassificáveis palavras.

Desclassifiquem de si a alva e santificada gramática
que nos faz escrever assim tão erroneamente:
tornem-na puta,
escrava da libidinagem,
mortal e humana.

Desbravem terras aquém dessa que nos reveste a vista:
pasmem por entre os jazigos cheios de escombros vitalícios
trazendo a mim
toda a ciência
dos microorganismos
que putrefazem a carne,
terrificam a atmosfera dos ares
e nos levam em alma ao paraíso
- ou o que quer que venha postumamente.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Não hei de fazer do meu verso
essa prosa infernal que aprisiona,
tortura e dilacera os ufanismos
das mentes extra-terrenas.

Todas essas letras que nos cercam,
ainda que carreguem em si
a mais pura ciência dos fatos,
são d'agora vis e enfadonhas.

O que vale, meus senhores errantes,
é a palavra que se perde ao sair do ser.
Não aquelas que vêm de fora
e tangenciam o cerebelo coordenadas.

Mais valem agora, até as seis da manhã
e o cabaré da próxima esquina,
as experiências de vidas tolices,
embasbacadas, alheias e indomáveis.

Mais valem agora, até as dez da noite
e o perdão da esposa que descansa,
os perjúrios de amor à meretriz
que agora possui maculado, o ventre.

Mais valerá o bom entendimento
do ladrão que outr'ora o aguardara
que o sorriso fecundado postumamente,
ostentoso e perdulário de piegas fanfarronices.

Hei de fazer, eu, uma sétima estrofe impetuosa
- que transgrida as barreiras de todo o escrito
e transcenda à quimera dos sonhadores.
Hei de cantar o amor, que se faz em verso e prosa.

E o sétimo estará também na oitava.
Na perfeição das sonoras notas.
Na melancolia dos dias.

[no vazio d'aqui.

terça-feira, 27 de abril de 2010

O ser humano perfeito
até hoje é uma quimera:
ainda após especiais efeitos
não perfaz o desejo
de quem não o exonera

da contínua batalha
que é travada em vida
e em morte endiabrada
que no caixão se valha
da formosura dos lírios.

Humilde por essência
e não de carência
- a qual muitos possuem.
Seja carência de riqueza,
de amor ou de gentileza

que a nossa alma seduz
no simples invejar dos olhos
ou no desviar dos olhares
àqueles que se encontram
a sós, perdidos, sem lares.

O ser humano perfeito
é perfeito em tudo que faz.
No menor pentear de cabelos
cada fio alheio se esvai
e a mente é fiel companheira

dos pentes que lhe penteiam
as madeixas cerebrais:
cada pensamento em seu lugar
e nenhum dos neurônios deve
qualquer maldade em si abrigar.

O ser humano perfeito tem
um único defeito, apenas,
que nos versos passados
é omitido com labor e pena:
não é perfeito, pois não existe.

domingo, 18 de abril de 2010

A vertigem das horas cedeu
ao espaço infinito do quintal.
Não sei mais quem sou eu
ou se essa estrada tem final.

Braços cruzados e pés descalços:
sujo de lama até os cabelos.
As horas urgem em espasmos
o triste fim do meu cerebelo.

O tempo implode e o som explode
um estalo seco em minha vida.
Será a vida ou a morte que me acode
após a pancada outr'ora sentida?

Os espaços foram transladados ao infinito
e os termos do início concluíram sua tarefa.
O sol brilha soberano e a terra continua girando
com uma estrela a menos, que jazia há muito
[apagada.

domingo, 28 de março de 2010

Quem será que fê-la tão bela?
A ponto de todas as outras
não se aparentarem sequer
a um leve toque de suas mãos.

Penso que deus não seja assim
tão justo, sensato e perfeito.
Se, dentre tantas outras mulheres,
fez a ti irremediavelmente linda.

Há quem ache defeito em seu olhar
- tolo! Mal sabe que aí dentro
há as coisas mais belas de se achar
e de se perder afora de ti.

Quisera o meu poema ser comparado
à métrica que existe em tuas linhas:
mãos, cabelos, dedos e unhas
- com certeza, tu és a abelha-rainha.

sábado, 27 de março de 2010

Malditos humanos
- caloteando uns aos outros
com o bendito pão sagrado
que o Divino lhes concede.

Malditos humanos
- falando das suas súplicas à toa.
Mal sabem que não são suas:
são dos outros, são de um.

Não copiam apenas a originalidade alheia.
Copiam-lhe os sentimentos e todas as dores.
Acham que o certo é certo e ainda mais:
que o errado é errado - grande erro.

Tudo é tudo e nada é nada.
Não há de ser certo o que não é errado.
E os erros e pecados alheios
hão de ser julgados em tribuna de santo ofício
[ - dentro da própria mente de quem peca.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Esconda-se de mim, Saudade.
Que, se te pego, viro-te ao avesso.
E não daremos só duas
- verás com teus próprios us e esses.

Saia pela porta dos fundos, Tristeza:
há muito tempo me tenho em abstinência.
E, caso em minha frente tu intercedas,
verás as três da manhã ficarem cansadas
[- ainda menos que o teu orifício anal.

Já se foram as duas:
agora restam apenas as minhas mãos.
Que sirvam para outro ofício
qual não aquele do qual se abstêm os homens sãos.

Sirvam para apressar os ponteiros da pressa
e fazer esse tempo girar menos vagaroso.
Gira, infâme vadio! Gira, toda a roda da vida.
Vai saracoteando todas as minhas mazelas
[- enquanto houver tempo e enquanto houver ânimo.

terça-feira, 16 de março de 2010

Saudades.jpg - Saudades de mim e dele

sábado, 13 de março de 2010

05 de Agosto de 2009
Quero pensar como os grandes homens
que vivem à frente do seu tempo,
inovam já o que não é mais possível
e fazem do impossível simplesmente inexistente.

Quero agir como agem os construtores do universo
que não se contentam em pensar, amar e viver
mas necessitam fatalmente de mudar o mundo
e reerguê-lo com as próprias mãos.

Quero amar como os grandes amantes
que se apegam a algo como se o fossem:
vivem, dormem, pensam e comem o que amam
- não apenas fingem que vivem da razão.

Mas quero continuar sendo pequeno
por que é sendo assim tão ínfimo
que eu posso me perder na grandeza
desse mundo de palavras.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Cantarei à minha terra
o amor que nunca senti
quando subir àquela serra
distante dos amores que hão aqui.

Voltarei ao cunho do abandono
e mendigarei aos deuses absolutistas
a misericórdia de qualquer abono
que de Petrolina me tragam notícias.

Se algum dia voltar às planícies que me desacolheram,
proferirei aos céus e às areias da ilha que me deixem
espairecer os prantos do coração metropolitano
nas águas gélidas que firmaram o rumo do meu ser.

Fugir a esmo! - eis o nome desse novo ato.
Que, feito um palhaço alheio aos risos,
novamente enceno e deixo o picadeiro setanejo.
Adeus, minha ficha dezenove interiorana.
[adeus.

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Não quero mais tequila.
Não quero mais vodka.
Não quero mais paixão.
Não quero mais amor.

Eu só quero o quarto aberto
com as pernas escancaradas.
Ávidas em receber meu membro
em prantos salutares de prazer.

Não quero mais desejo.
Disso já me tenho suficiente.
Não quero mais saudades.
Todas fincaram minha terna mente.

Anseio pelas lutas de quereres-não-quereres
que pelos prazeres que afincam a carne
e o devaneio que se faz um instante
por dizer que só quero a ti, nada mais.


Por assim de "z" que só quero sexo.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

A gente vai crescendo
e vai se achando importante.
E vai se achando pequeno
e vai se achando distante.

E vai se ficando mais chato
quando vai se ficando mais real.
E vai se ficando ranzinza,
Se a mágica vai se ficando banal.

O amor vai se diminuindo aos pouquinhos,
o diminutivo vai se diminuindo depressa.
A tristeza vai se diminuindo um bocado
quando a riqueza vai se diminuindo sem pressa.

O tempo vai acabando
e a gente vai ficando sem tempo
e vai se achando sem tempo
e vai se diminuindo sem tempo.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Não posso negar que vim de onde venho
e não tenho a mínima ideia de onde vou.
Mas posso me opor à verossimilhança vital
que se abstém das perniciosidades do espírito.

Não que revele religiosidade, afirmando pernicioso.
Mas a espiritualidade das concupiscências da carne
é muito mais cruel e além que pode sonhar
o nosso auto-prazer masturbatório, quer seja
[anal
[vaginal
[escrotal

E por falar em escroto, qual palavra escrota
essa tal de concupiscência!
Não sei se está certa, a grafia,
a caligrafia, a orgia, a caristia.

Profano! - profano, digo eu, - profano!
Ou português ou gramática negra:
dize a esta alma entristecida se verá
outra outr'ora perdida entre hostes celestiais.
[disse o corvo: nunca mais.



Nunca mais.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Vem, estrela da última hora.
Cala em mim o teu luxurioso escândalo
que se despe entre três ou mais bibelôs.
Sacia de ti toda a ganância da impureza.

Vem, antes que a lerdeza das horas acabe
e o céu fique mais claro que meu desejo
de possuir-te e embranquecer teus lábios.
Antes que se fechem as portas do cabaré.

Ainda antes que o meu amor de duas noites se esvaia
por entre outros ventres menos desejados, menos avultados,
menos maculados e menos dilacerados que o teu.

Careço que venhas antes que meu violão se perca
nas notas das outras noites que vivi pelo desejo de ti.
Vem, antes que o meu dinheiro acabe.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

O estratagema do universo paira sobre mim:
infâmias refeitas em carícias e gestos.
O tal sentimento se perdeu no mar-sem-fim
- talvez escondido na melodia dos versos.

O piegas d'outrora foge ao libidinoso vadio
e as doces falenas ainda habitam meu coração.
Não mais os restos de alimento presos aos dentes
- como a finda paixão que deixa resquícios espermáticos.

O universo, no entanto, ainda se expande
como quem não tem nada o que ver com isso.
As estrelas nascem, brilham e morrem
mas o sol persiste em sua teimosia luminosa.

E o pulso cardíaco desobece ao instinto vital:
pulsa por bater, pulsa por morrer, por querer.
Mas não pulsa, meu obsequioso ruminador,
não pulsa pela em si razão de viver.